quarta-feira, 5 de setembro de 2007

UNIVERSITAS MAGISTRORUM AC SCHOLARIUM

Professores para quê?
[George Gusdorf]
(excerto)




(...) O mestre é aquele que ultrapassou a concepção de uma verdade como fórmula universal (...) para se elevar à ideia de uma verdade como procura. O mestre não possui a verdade e não admite que alguém possa possuir. Faz-lhe horror o espírito de proprietário do pedagogo (...). O obscurantismo pedagógico procura asilo e refúgio na tecnicidade. Ele aborda os problemas do ensino através da particularidade das faculdades humanas, propondo-se educar a atenção, a memória, a imaginação, ou pela descrição das especialidades didáticas, propondo-se então a tarefa de facilitar a aprendizagem do cálculo, do latim ou da ortografia. O pedagogo transforma a sua classe numa oficina que trabalha com vista a um rendimento; ele mantém a sua boa consciência à custa de gráficos e de estatísticas sabiamente doseadas e cheias de promessas. No seu universo milimetrado, faz figura aos seus próprios olhos de feiticeiro laico e obrigatório, manipulador de inteligência sem rosto. O mestre autêntico é aquele que nunca esquece, qualquer que seja a especialidade ensinada, que é da verdade que se trata. Há programas, bem entendido, e actividades especializadas. É necessário, tanto quanto possível, respeitar os programas. Mas as verdades particulares repartidas através dos programas não são senão aplicações e figurações de uma verdade de conjunto, que é uma verdade humana, a verdade do homem para o homem. A cultura não é outra coisa senão a tomada da consciência, por cada indivíduo, dessa verdade que fará dele um homem. O pedagogo assegura o melhor possível ensinamentos diversos; reparte conhecimentos. O mestre quer ser antes de tudo um iniciador da cultura. A verdade é para cada um o sentido da sua situação. A partir da sua própria situação em relação à verdade, o mestre tenta despertar os seus alunos para a consciência da verdade particular de cada um.

in "Professores para quê?", Georges Gusdorf, Martins Fontes, 2003.